Será que a conquista do Hexa é a maior preocupação do Brasil hoje?
Por Luciana Oliveira Pereira:
Apesar da visível falta de empolgação nesta Copa, por parte de muitos brasileiros, ainda vemos ruas sendo pintadas, homens e mulheres empunhando ou vestindo as cores da bandeira ou mesmo pintando a cara de verde e amarelo para o grande momento do jogo.
Para tristeza de muitos, o primeiro jogo, ocorrido no último domingo (17) trouxe a possibilidade de mais uma vez não sermos os melhores do mundo. Mas, a questão que ressoa é, diante da crise política, econômico-financeira e social, como há clima para se parar a vida e ver os jogos da seleção? E ai muitos bradam: ah, o Brasil é o país do futebol! Será mesmo?
Em nosso país há inúmeras situações positivas e experiências que estão dando certo, contudo, há 13,7 milhões de pessoas desempregadas segundo dados disponibilizados em abril pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São 13,1% da população, em média, desempregada no primeiro trimestre e essa é a maior taxa desde maio do ano passado. Provavelmente este grande grupo não tem muita animação para ver a seleção jogar e nem participa de bolão.
Mas o governo comemora dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados-CAGED, que mostram que em março foram abertas 56.151 vagas de emprego formal, sendo o terceiro mês de aumento seguido no número de vagas com carteira assinada. Mas ora, são 56 mil postos de trabalho num mês contra 13 milhões de desempregados?!
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) publicado mês passado, o Brasil subiu duas posições entre 2015 e 2016, passando a ter a 7ª maior taxa de homicídio das Américas e a nona do mundo. No país ocorrem 31,3 mortes para cada 100 mil habitantes. No mundo a taxa é de 6,4 mortes, um quinto da nossa. Números apontam uma estimativa de que haja 160 homicídios por dia no Brasil. Isso não alegra a torcida de nenhum país, é mais um chute, só que em nosso estômago.
A pesquisa Síntese de Indicadores Sociais - SIS 2017 (IBGE) mostrou que os brasileiros que vivem na linha de pobreza somam 50 milhões de pessoas, ou seja, 25,4% da população que têm renda familiar equivalente a R$ 387,07. O dado é calculado com base no valor adotado pelo Banco Mundial para definir se uma pessoa é pobre.
Já a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) do mesmo Instituto, com dados de 2016, revelou que ainda há no Brasil cerca de 11,8 milhões de analfabetos, ou seja, 7,2% da população com 15 anos ou mais.
Estes são apenas alguns números, numa grande rede de informações que demonstram a grave crise que o povo brasileiro sofre, sem contar também com os desvios de dinheiro público e a corrupção, que tem colocado o Brasil no topo do ranking mundial e sem taça. A Lava Jato contabiliza cifras de corrupção sem precedentes na história, ultrapassando a casa dos trilhões. E como driblar toda esta complexidade de situação?
A questão não é contra quem consegue parar sua vida em dia de jogo e torcer - como se existisse um mundo a parte, mas olhar para estes dados e enxergar uma triste e desumana realidade que muitos brasileiros, de carne e osso, estão vivendo. Pois sendo dia de jogo de Copa ou não, estando empregado ou desempregado, estamos todos colocados diariamente frente a impostos altíssimos e juros abusivos; tentando pegar um transporte coletivo sucateado; entregues a um sistema de saúde pública, modelo no papel, mas estrategicamente deixado ao abandono para que possa falir, e a educação segue no mesmo rumo. Aqui saneamento básico não fica nem no banco de reservas.
Enquanto nossos respeitáveis jogadores, hoje milionários, assim como um grupo seleto ligado diretamente ao futebol, sua a camisa para trazer o título, milhares de brasileiros estão perdendo perspectiva, já suando em busca de subempregos.
Sem trabalho não há salário, sem dinheiro circulando não há consumo, ai se produz um ciclo monstruoso, onde pouquíssimos ganham algo. Claro que esta é uma visão simplificada de uma complexidade que envolve muito mais aspectos e gera enormes problemas.
Com a proximidade das eleições virou coro defender a mudança do país através do voto. Ótimo, votar em pessoas dignas, sem passado sujo, seja ele público ou privado, e identificadas com os valores da democracia é primordial, mas é preciso vestir a camisa desta nação, de corpo e alma, não só em dia de jogo. Cada um deve buscar fazer a sua parte, acompanhando, participando e agindo, nem que seja lá no meu microcosmo, falta envolvimento!
Enquanto esta nação, como povo, não tomar a vitória para si, o jogo não será ganho. Estamos urgentemente precisando de muitos títulos e isso não tem nada a ver com a Copa. O hexa não trará nenhum benefício econômico, social ou qualidade de vida para milhões que estão buscando Sobreviver. Neste jogo assim como na copa, não tem chance, muito menos rebaixamento é só no mata-mata.
Luciana Oliveira Pereira é jornalista em Cuiabá, mãe, brasileira e tem muita fé na vitória da nação através do seu amadurecimento.