OUTUBRO ROSA: A cada 100 laudos positivos de câncer de mama 1 homem é atingido - confira relato
No início de 2016, o professor universitário César Pereira de Lima, 46 anos, brincava com o filho mais novo quando sentiu uma dor intensa no peito, após a criança encostar em sua mama esquerda. Dias depois, foi ao médico, passou por exames e recebeu um diagnóstico inesperado e raro para homens: câncer de mama
No Brasil, a cada 100 casos de câncer de mama, apenas um envolve homem. Em razão do baixo índice entre o sexo masculino, o professor comenta ter ficado extremamente surpreso com o diagnóstico. “Antes da descoberta, eu notei que havia algo estranho na minha mama, porque o mamilo havia retraído, mas nunca pensei que pudesse ser câncer”, diz.
“Foi uma situação muito difícil. Para qualquer pessoa, descobrir um câncer é um choque. Mas para homem descobrir um câncer de mama é um choque maior ainda”, completa.
A descoberta da doença foi em março de 2016. Um exame comprovou que o nódulo na mama do professor era maligno. O caroço, de 0,4 centímetros, apresentava sério risco à saúde do paciente, informou o médico. No mês seguinte, o homem teve de passar por uma cirurgia de emergência para a retirada completa da mama esquerda. Em 30 dias, o nódulo havia crescido para 0,6 centímetros.
“A cirurgia foi um procedimento semelhante ao que as mulheres com a doença passam. Foi retirada toda a mama e uma parte da região da axila, porque também havia indícios de câncer embaixo do braço”, comenta.
Ele acredita que o câncer foi desenvolvido em razão de estresse que enfrentava na carreira de professor. “Eu dava aula em três unidades de ensino diferentes e cheguei a ter 2 mil alunos em certo período. Então era muito cansativo”, conta. Outra possibilidade para a doença é a mutação genética. “Não é uma chance descartada, até porque tive a doença em período considerado anterior ao que os outros homens têm, porque ela costuma surgir mais tardiamente”, pontua.
Geralmente campanha foca na mulher
Segundo o mastologista Aguiar Farina, que atende a diversos casos de câncer de mama, os homens têm menos chances de desenvolver a doença porque possuem a mama mais atrofiada, pois têm menor quantidade de estrogênio, o hormônio feminino. “Mas não é impossível que eles desenvolvam a doença”, explica.
Ele relata que os tratamentos aplicados aos homens e às mulheres são semelhantes. “Eles passam pela cirurgia, que comumente é a primeira fase, depois fazem quimioterapia, radioterapia e, por fim, a hormonioterapia”, detalha.
Conforme o médico, é mais fácil para os homens perceber um possível nódulo na mama. “O caroço aparece com mais facilidade para eles. Nas mulheres, os nódulos podem surgir dentro da mama, então dificulta a descoberta”, diz.
Farina esclarece que casos de câncer de mama no público masculino costumam atingir homens a partir dos 60 anos. “Mas pode ocorrer entre mais novos também”.
Professor César, em fase de tratamento e portanto sem os cabelos, jantando com a família em momento de lazer
Apoio da família
Desde a descoberta da doença, César recebeu intenso apoio da esposa, com quem está casado há 22 anos, e dos dois filhos, de sete e 14 anos. “O auxílio da minha família e dos meus amigos foi fundamental. Não tenho dúvidas de que eles me ajudaram muito”, declara.
Segundo o professor, a esposa ficou extremamente abalada com a descoberta da doença do companheiro. "Hoje já superamos essa fase de dificuldade. Mas no início, ela recebeu a notícia como se fosse um diagnóstico de morte”, diz.
Para o filho mais velho, ele explicou a realidade da doença. “Ele entendeu bem, me acompanhou em algumas sessões de quimioterapia e tem muita preocupação comigo”, revela. Ao mais novo, ele apenas disse que o pai estava com um “bichinho”, mas não escondeu os tratamentos pelos quais passou. “Ele também me acompanhou em alguns tratamentos”.
Depois da cirurgia, o professor começou a fazer quimioterapia. Foram 18 sessões, de junho a dezembro de 2016, seguidas por 25 de radioterapia, de dezembro do mesmo ano a fevereiro de 2017.
Ele acredita que um dos fatos que contribuíram para que a doença não chegasse a níveis mais graves foi a descoberta precoce. “O câncer estava indo do estágio um para o dois. A doença tem quatro estágios e a maioria das pessoas descobre quando está no terceiro ou quarto, quando já esparramou para outros órgãos e não há muito o que fazer”, diz.
“A maioria descobre (o câncer de mama) quando está no terceiro ou quarto (estágio), quando já esparramou para outros órgãos e não há muito o que fazer”
Durante o tratamento contra o câncer de mama, em Cuiabá, César viajava com frequência para São Paulo, onde se consultava com especialistas. Na capital paulista, conheceu outros homens que também enfrentavam o câncer de mama. “Por aqui, em Mato Grosso, era somente eu. Mas em São Paulo conheci vários casos, porque lá é referência no tratamento contra a doença”, explica.
Entre os colegas que conheceu, alguns estavam em boa situação, mas havia outros que haviam descoberto a doença tardiamente. “Um deles estava em estado terminal. Conheci também outro que depois morreu em razão da doença”.
Câncer nos pulmões
Em dezembro de 2016, enquanto concluía o tratamento de quimioterapia, o professor passou por exames que detectaram manchas em um de seus pulmões. Posteriormente, o médico descobriu que tratava-se de uma metástase do câncer de mama. “Foi difícil descobrir que o a doença avançou, mas novamente contei com o apoio da minha família e dos meus amigos”.
No início de 2017, ele começou tratamento contra o câncer nos pulmões, após encerrar a radioterapia para tratar a doença na mama. “Para esse cancer nos pulmões, farei tratamento por toda a vida. Uma vez por mês, faço quimioterapia”, diz.
O professor faz acompanhamento constante para descobrir se a doença não avançou para outros órgãos. “Por toda a minha vida, terei de fazer esse controle”. Em relação ao câncer de mama, prefere não tratar como uma doença curada. “Não digo que me curei, porque é uma doença da qual terei que fazer acompanhamento para sempre, apenas terminei o tratamento”, pondera.
Um ano após encerrar o tratamento na mama esquerda, surgiram caroços na direita e os médicos suspeitaram que pudesse ser um novo câncer. “Fizemos exames, mas descobriram que não era a doença”.
Cicatriz vira orgulho
Ao levantar a camisa para mostrar a mama esquerda, César afirma não ter vergonha da marca deixada pela cirurgia. “É um sinal de que eu venci a doença”, comenta. Ele não vê problemas em sair sem camisa. “Se alguém perguntar, eu explico sobre a doença e digo como a venci”, pontua.
Frequentador da Igreja Batista, ele comenta que a fé foi fundamental para que pudesse ter sucesso no tratamento contra o câncer. “Acredito que quando a pessoa tem fé, as coisas melhoram e ela tem muito mais chances de conseguir o que deseja”, relata. Hoje, o professor costuma falar sobre sua história em igrejas do Estado. “Muitas pessoas me pedem conselhos sobre a doença e querem saber como enfrentei tudo isso”.
Há dois meses, César deixou as aulas, por recomendação médica. O professor somente deixou o trabalho quando estava na fase final da quimioterapia, mas retornou logo que encerrou o tratamento contra o câncer de mama. “Nos últimos meses, os médicos me aconselharam a me afastar das aulas por conta do estresse que o serviço estava me causando”, diz.
Ele segue afastado do trabalho e estima que em dois anos conquiste a aposentaria, por tempo de serviço. Para os próximos meses, planeja ajudar outras pessoas que enfrentam doenças como o câncer e também quer usar o conhecimento como administrador para ensinar pequenos empreendedores. “Eu vou tocar a minha vida normalmente, apesar de toda a experiência que tive com a doença. Me sinto curado emocionalmente e espiritualmente. Fisicamente, terei de fazer tratamento por toda a vida, mas acho que o mais difícil já conquistei, que é a cura emocional e espiritual”.