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Trabalhadores de obra milionária viviam em situação de escravidão



O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) obteve, no dia 6 de outubro, liminar em face do empresário Ademir Battisti e das empresas Construtora Portal Ltda. (Construtora Portal do Cerrado), Plasson do Brasil Ltda. e Seara Alimentos Ltda. (grupo JBS/Friboi), após diversas irregularidades relativas ao meio ambiente de trabalho terem sido encontradas na construção de galpões de aviário em uma granja em Tangará da Serra.

As graves ilicitudes foram descobertas durante fiscalização realizada pela Superintendência Regional do Trabalho de Mato Grosso (SRT-MT) em setembro de 2019. Na ocasião, os auditores fiscais do Trabalho lavraram 24 autos de infração e resgataram os trabalhadores que estavam alojados no local.
Os trabalhadores laboravam sem registro e em condições precárias, sem camas, água potável ou refeitório. 

O banheiro era de terra batida e desprovido de descarga. O alojamento não oferecia proteção contra intempéries nem contra a entrada de insetos e animais peçonhentos ou transmissores de doenças, já que as paredes e divisórias eram feitas de madeirite. Além disso, havia risco de choque elétrico e de incêndio em razão de as instalações elétricas serem improvisadas, repletas de “gatos”.

Com a liminar obtida pelo MPT, as empresas e o empresário deverão se abster de manter trabalhadores em condições degradantes de trabalho e, por qualquer meio, de contribuir ou consentir com essa prática em suas propriedades ou em atividade a que estejam vinculados como integradores, integrados, empreiteiros, prestadores de serviço ou outra condição, incluindo as obras de aviários e outras construções decorrentes de contratos de integração, de empreitada, de prestação de serviço ou outro tipo de parceria.

Foram estabelecidas na decisão outras 16 obrigações de fazer e não fazer, que deverão ser cumpridas nos prazos fixados pela Justiça do Trabalho, sob pena de multa e até de interdição das construções dos galpões de aviários.

O MPT apurou que a obra foi financiada e realizada em local previamente determinado pela Seara Alimentos Ltda. Por intermédio do frigorífico, Ademar Battisti contratou a empresa Plasson para a construção dos aviários. Esta, por sua vez, subcontratou a Construtora Portal para a execução do serviço.

“Uma pequena parte dos milhões orçados da obra deveria ter sido gasta para comprar colchões, instalar alojamento adequado, com resguardo da intimidade, com armários, banheiros, proteção contra intempéries e contra a entrada de animais, com instalações elétricas adequadas, local para armazenar comida, respeitando-se a privacidade, a segurança e dignidade dos trabalhadores”, critica o MPT na ação.

A Seara e o empresário Battisti possuem contrato de integração para a avicultura. Por força desse contrato, a primeira (integradora) fornece pintos de um dia ao segundo (integrado), que cria e engorda o frango, entregando, ao final, toda a produção para o frigorífico.

“Por um lado, ocorreu cegueira deliberada por parte da Plasson e da Seara, que, mesmo cientes da falta de registro de empregados e das precárias condições de trabalho e de alojamento dos trabalhadores, nada fizeram para adequar a situação. Por outro lado, a jurisprudência pacífica do Tribunal Superior do Trabalho reconhece a responsabilidade do dono da obra pelo descumprimento de normas de saúde e segurança do trabalho”, afirma o MPT.

O MPT demonstrou que todos os envolvidos estavam sendo beneficiados pela obra e tinham conhecimento das condições precárias de saúde e segurança fornecidas aos trabalhadores da construtora, ensejando responsabilidade solidária dos réus. Funcionários da Plasson e da Seara estavam, inclusive, acompanhando a obra e comparecendo ao local.

Condições precárias

Todos os 29 trabalhadores que laboravam na obra estavam sem registro na carteira, apesar de cumprirem funções diretamente ligadas à construção civil. Por ocasião do resgate, a SRT teve, ainda, que emitir as Carteiras de Trabalho e Previdência Social (CTPS) de seis empregados, uma vez que estes sequer possuíam o documento. “Se algum obreiro ficasse doente ou sofresse acidente, não teria qualquer benefício previdenciário. Inexistia, também, qualquer assistência médica no local”, pontua o MPT na ação.

A fiscalização da SRT constatou a inexistência de materiais necessários para a prestação de primeiros socorros, além de não realização dos exames médicos admissionais, falta de treinamento para trabalho em altura e não fornecimento de vestimentas de trabalho.

De acordo com o relatório, o alojamento estava desprovido de armários e de locais para guardar os pertences dos trabalhadores, razão pela qual os objetos ficavam “junto de ferramentas, em cima da cama, no chão, em todo lugar, deixando o ambiente desorganizado, sujo e ainda mais exposto à proliferação de insetos. Além disso, ao não ter onde deixar os pertences, os trabalhadores não possuíam a segurança de ter um local onde pudessem guardar seus objetos e ficavam sujeitos a furto”.

Da mesma forma que não havia armários para a guarda dos pertences dos empregados, inexistiam armários para os utensílios de cozinha e para conservação dos alimentos. “Não havia local com mesas, cadeiras, cestos de lixo, lavatório para lavar as mãos e outras condições para garantir que os trabalhadores tivessem sua refeição com conforto e higiene”.

Também não havia camas no local. Os trabalhadores precisavam improvisar leitos com tábuas e tijolos. “Não obstante a obra envolver milhões de reais investidos, os trabalhadores alojados não receberam sequer camas para dormir. Somente foram fornecidos colchonetes e, mesmo assim, apenas para parte dos empregados. Alguns trabalhadores trouxeram colchões, que foram repassados para outros, à medida que iam saindo da obra”, explica o MPT. Fotografias mostram a situação precária, com alguns colchonetes amontoados, bem como colchões rasgados e sujos.

As roupas de cama existentes foram todas adquiridas pelos próprios trabalhadores. Como não havia lavanderia, eles lavavam suas roupas no chuveiro e as penduravam em varais e também em fios improvisados da instalação elétrica.

A água fornecida era de um poço artesiano, cuja potabilidade não foi atestada. “Ressalta-se que o trabalho é pesado, e o clima é quente na região, o que requer, ainda mais, a disponibilidade de água potável, fresca e de forma abundante, o que não era observado”, sublinha o MPT.

Para a Justiça do Trabalho, as situações não apenas atentam contra disposições normativas regulamentadoras do ambiente de trabalho, mas também contra a dignidade, integridade, liberdade e à própria vida dos trabalhadores. “Ainda que não se trate de provas irrefutáveis, até porque serão devidamente oportunizados contraditório e ampla defesa aos réus para que as possam contrapor, são fortes as evidências que, em rito de cognição sumária, demonstram um ambiente de trabalho completamente degradado”, afirmou o juiz Pablo Saldivar da Silva na decisão. “Nada mais se exige dos réus que o cumprimento de obrigação legal a todos imposta (...)”, acrescentou o magistrado.

Fonte: Folhamax

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