Juiz condena Estado a indenizar homem preso ilegalmente pela comarca de Rosário Oeste
E.O.S. permaneceu nove dias na cadeia apenas porque tinha o mesmo nome que acusado de crime
O juiz Agamenon Alcântara Moreno Júnior, da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública, condenou o Estado, por danos morais, a indenizar E.O.S. em R$ 30 mil por tê-lo mantido preso indevidamente durante nove dias.
A decisão é passível de recurso.
Segundo o processo, uma ação criminal de 1995, da Comarca de Rosário Oeste (111 km de Cuiabá), tinha como réu um homem com o mesmo nome de E.O.S. No entanto, a denúncia não trazia dados mais aprofundados sobre o criminoso, como CPF, RG e filiação.
Em 2001, a juíza da comarca decretou a prisão preventiva de duas pessoas com o mesmo nome sem que fosse constatado que eles haviam cometido algum crime ou fossem réu na ação de 1995, já que a única coisa em comum que eles tinham com o criminoso era o nome.
O autor da ação de indenização relatou, no processo, que teve sua prisão cumprida pela Polícia Militar em 2007, quando se deslocava de São Paulo para Mato Grosso do Sul.
Na ocasião, ele teria ficado detido por nove dias, de 18 de maio a 26 do mesmo mês.
Ele alegou que o prazo que o Estado tinha para efetuar a prisão já havia extrapolado no momento da abordagem feita pela polícia.
E.O.S. solicitou, na ação, impetrada na comarca de Ivinhema (MS), a indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil.
O Estado de Mato Grosso alegou, por outro lado, que a prisão decorreu de um processo criminal, o que configuraria em um ato legal.
Afirmou ainda que não existiu má-fé ou conduta temerária por parte do Estado e alegou a incompetência territorial, já que a prisão foi efetuada em Mato Grosso do Sul e não em Mato Grosso.
Ato ilícito
O juiz compreendeu, em sua decisão, que o “dano material” não consiste na prisão na cidade de Mato Grosso do Sul e sim no “ato ilícito” praticado pelo agente público vinculado do Estado de Mato Grosso, que ordenou judicialmente a prisão preventiva de E.O.S..
Ele afirmou ainda, pautado pela Constituição, que cabe ao Estado responder pelos danos que seus agentes causarem a terceiros.
“Desse modo, para configuração da responsabilidade civil e, consequentemente, do dever de indenizar por parte do Estado, basta que se comprove o ato ilícito, o dano e o nexo causal entre ambos, sendo desnecessário perquirir quanto ao elemento subjetivo”, afirmou o magistrado.
O magistrado constatou que na denúncia de 1995 constavam apenas as qualificações indiretas do indiciado descritas por uma testemunha: possuía aproximadamente 28 anos de idade, era moreno, magro, tinha 1,60 de estatura, olhos pretos, barba e bigode raspados.
Como, segundo o juiz, não existiam maiores dados sobre o acusado, foi realizada uma citação por edital, da qual encontraram dois sujeitos de nome E.O.S., um nascido em 1959 e outro em 1977.
“Nenhum dos dois indivíduos corresponde à qualificação constante até então dos autos criminais, porquanto se o acusado possuía aproximadamente 28 anos na data da denúncia (1995), é porque era nascido aproximadamente em 1967, sendo que as duas pessoas mencionadas às fls. 96/97 são nascidas em 1959 e 1977, uma diferença de quase dez anos para mais e para menos, respectivamente, a qual é bastante significativa”, constatou o magistrado.
Para Alcântara, o Estado tem o dever de proceder à persecução penal e que a prisão preventiva do indivíduo, por si só não configura ato ilícito.
No entanto, o magistrado afirmou que foi configurada a falha na prestação de serviços por parte do Estado, já que o mandado de prisão preventiva foi expedido em desfavor de duas pessoas que não correspondiam às características descritas pela testemunha.
“Nesse contexto, restou demonstrado o ato ilícito praticado pelo Estado de Mato Grosso, que por meio de seus agentes estatais expediu mandado de prisão em desfavor de duas pessoas numa ação penal em que figurava apenas um acusado, sendo que a qualificação daqueles sequer correspondia à qualificação deste”, afirmou o juiz.
Quanto aos danos morais, Alcântara utilizou um entendimento segundo o qual não será toda e qualquer situação de sofrimento, tristeza, transtorno ou aborrecimento que ensejará a reparação, mas apenas as situações graves o suficiente para afetar a dignidade humana.
“No caso dos autos, a pretensão indenizatória merece prosperar, haja vista ser inegável que a prisão ilegal, que perdurou 09 (nove) dias, de 18/05/2007 a 26/05/2007 (fls. 190), gerou intenso sofrimento psicológico no autor, acarretando dano moral”.
O juiz considerou que R$ 30 mil seria uma quantia expressiva para compensar o sofrimento provocado pela ofensa, não representando, no entanto, fonte de enriquecimento.
“Diante de todo o exposto, julgo parcialmente prodecente o pedido, para condenar o réu a pagar ao autor indenização por dano moral no valor de R$ 30.000 (trinta mil reais)”, concluiu o magistrado.